Por Gustavo Matera – 01/08/2005 |
Eric Mifune
“Foi uma experiência sensacional. É um evento grandioso, com uma organização impecável. A primeira visão de um salão com 200 mesas e 2000 pessoas jogando ao mesmo tempo é inesquecível. ” Notas Pessoais |
Como vocês já deveriam saber, neste ano tivemos um “brava gente brasileira” entre as grandes estrelas do Poker no WSOP 2005. Eric Mifune – esse é o nome do brasileiro que figurou em 225º lugar no WSOP 2005, obtendo a melhor colocação para os brazucas na terra do Tio Sam.
Com grande orgulho de sua primeira experiência num World Seriers of Poker, esse paulista de 29 anos concedeu ao Clube do Poker uma entrevista sobre a sua aventura. Confira abaixo:
Em que ano você começou a jogar poker?
Não me lembro exatamente mas lá para o final dos anos 80, com cerca de 15 anos, com meus amigos do Santa Cruz. Jogávamos entre 2 a 3 vezes por semana, por muito tempo.
O que mais o motiva a jogar Poker?
O poker é um jogo fascinante, que mistura diversos tipos de habilidades, desde a estatística até a psicologia. Dominar estes conceitos e conseguir aplicá-los numa mesa de poker é o que me motiva.
Quais haviam sido os seus melhores resultados até o WSOP 2005?
Tenho jogado Texas Hold’Em há apenas uns 9 meses. Neste período comecei jogando de tudo, desde pequenos Sit & Go, até alguns cash games mais violentos. A partir de março, decidi que queria jogar o WSOP e passei a jogar apenas torneios. Fiquei em 4º lugar num dos Campeonatos Paulistas (cerca de 80 jogadores) e ganhei um ou outro torneio menor. Nos torneios do Conrad (Punta del Este) e do Costanera (Assunción) não fui tão bem. O ritmo de jogo era muito acelerado e, nesses casos, é difícil ter o controle da situação. As cartas acabam pesando muito. Fui para Vegas no começo de julho. Lá, joguei um torneio no Bellagio (US$ 500 de buy-in ganho num satélite de US$ 100) e fiquei em 13º, entre uns 180 jogadores. Depois, joguei um satélite de US$ 200 com rebuy para o WSOP. Foram uns 400 jogadores e oferecia 18 inscrições para o WSOP. Foi aí que me classifiquei e, dentre os 18, o único que não fez nenhum rebuy. Finalmente, no Main Event do WSOP, fiquei em 225º.
Quando e como foi a 1º participação em um torneio oficial?
Minha primeira participação foi no Main Event do WSOP 2005, torneio para o qual vinha me preparando já há alguns meses.
Qual foi a sensação de participar deste WSOP? Quais eram suas expectativas?
Foi uma experiência sensacional. É um evento grandioso com uma organização impecável. A primeira visão de um salão com 200 mesas e 2000 pessoas jogando ao mesmo tempo é inesquecível.
Minha principal expectativa era jogar um bom torneio, o que acho que consegui. É um torneio muito duro, com muitas horas de jogo por dia, muita tensão e sofri um pouco com isto. Para mim, particularmente, o torneio foi complicado, as cartas não vieram e tive que jogar um torneio de sobrevivência. Em mais de 40 horas de jogo, não vim com A-A nenhuma vez e vi um K-K apenas uma hora e meia antes de ser eliminado. As duas principais mãos que ganhei, no primeiro dia (em que saí de 10.000 para 62.000 fichas) foram com 4-4 e 8-8, mãos que gosto de jogar.
O que você achou do seu resultado?
Obviamente fiquei muito contente com meu resultado. Foi meu primeiro WSOP e foi a melhor participação de um brasileiro. E havia alguns brasileiros que considero muito fortes por lá: o Christian e o Raul, que estão se dedicando integralmente ao poker e vêm mostrando grandes resultados (já inclusive joguei com eles no Portobello, em Mangaratiba – RJ), o Rodrigo “Zidane” Capriolli, que vem estudando firme e é um jogador muito sólido, e o Omar Abede, que considero um dos melhores jogadores do país.
Aliás, aproveito para agradecer e mandar um puta abraço para o Zidane e o Omar , que foram meus “parceirões”, meus técnicos e meus amigos durante o WSOP. A cada intervalo foram eles que me deram força e era com eles que discutia minha estratégia para as próximas horas de jogo. Valeu, Zidane e Omar!!!
Você lembra da jogada decisiva de sua eliminação?
O pior é que me lembro bem da jogada. Estava jogando já havia algum tempo na featured table da ESPN e, naquele momento, era o que tinha menos fichas na mesa – cerca de 60.000.
Os blinds estavam em 2.000-4.000 com 500 de ante e eu era o primeiro a falar. Vim com A-Q de espadas e dei um raise para 16.000. Todos fugiram, exceto o dealer, que, após algum tempinho de reflexão, pagou. Small e big blinds fugiram também. O flop veio 8-5-2, rainbow, que não me ajudou mas que com certeza não deveria ter ajudado meu adversário também. Sem pensar, dei meu all-in de cerca de 45.000 fichas. O dealer pensou uns 5 minutos, o croupier abriu o tempo de 1 minuto para ele e, finalmente, ele pagou. Ele tinha 6-6 na mão, nem A e nem Q vieram e eu fui eliminado.
Analisamos depois esta mão por bastante tempo e ainda não tenho certeza alguma sobre a jogada. Acho que era uma mão muito difícil de pagar com 6-6. Poucos teriam pago, já que eu poderia ter um par maior na mão. Mas o que não contei ainda é que o tal dealer, meu adversário nesta mão, era simplesmente o “Professor” Howard Lederer. É complicado jogar com um adversário como ele porque, para ele, ficar em 225º ou em último é quase a mesma coisa. Ele está lá para chegar na mesa final e, por isto, muitas vezes arrisca umas mãos que outros mais sólidos não arriscariam. Além disto, não tenho dúvidas de que devo ter deixado algum “tell” para ele. Em quase 5 minutos olhando para mim, devo ter demonstrado a minha tensão. Mas ainda acho que foi um lance interessante.
O que você deveria ou poderia ter feito para conseguir uma melhor colocação?
Acho que quando você joga um torneio como este, você joga para sobreviver e chegar longe ou você joga para ganhar o torneio. Eu, numa primeira participação, joguei muito para chegar longe e ganhar “horas de vôo”. Houve até algumas mãos em que eu calculei que teria algo como 60% contra 40% de ganhar, mas considerei que dar 40% de chance para as cartas me eliminarem era muita coisa.
Além disto, o preparo físico e mental é muito importante num torneio longo como este. Fiquei 2 dias em concentração total no hotel antes do torneio começar, mas isto ainda foi pouco. Por fim, para um fumante como eu, ficar horas sem poder fumar na mesa, com aquela tensão por todos os lados, é muito duro. Isto eu preciso resolver, se quiser ir melhor nos próximos torneios.
Você se deparou com algum “figurão”? Como foi?
Em minha primeira mesa joguei com o “Minneapolis Jim” Meeham, um jogador fortíssimo que fala o tempo inteiro, bebe sua Heineken também o tempo inteiro e provoca todo mundo. Ele quase foi eliminado nesta primeira mesa e ainda ficou em 127º.
No penúltimo dia, joguei por muitas horas com um jogador muito simpático, com quem conversei bastante, que quase foi eliminado por muitas vezes, e, no final, ele era o Steve Dannenmann, que ficou em 2º e levou US$ 4,5 milhões para casa.
E ainda, joguei algumas horas com o Howard Lederer, que eu já considerava um dos melhores jogadores do mundo e, tendo sido eliminado por ele, preciso enfatizar isto ainda mais, não é?
Qual foi a sua melhor jogada?
Não tive muitas grandes jogadas. Joguei mais na consistência de roubar uns pingos aqui e ali, ganhar uma ou outra mão, etc. No primeiro dia, ganhei 2 boas mãos com 4-4 e 8-8. Na primeira, virou um 4 no flop me dando uma trinca e consegui controlar bem as apostas até tomar um all-in de um cara que fez 2 pares no turn.
A mão com 8-8 ganhei porque meu adversário pretendia me esfolar e deu um slowplay com uma mão soberana. O flop veio A-Q-J. Ele tinha K-10 e já estava seguido no flop. Bateu mesa e eu acompanhei. No turn, vira o 8 e eu faço a trinca. Apostei uns 2.500 e ele só pagou. No river, dobra o J e eu faço o full house. Eu aposto pouco, ele repica e eu dou o all-in nele. Ele acabou pagando e foi eliminado. Se, logo no flop, ele tivesse apostado qualquer coisa (qualquer coisa mesmo), eu teria fugido. Coisas do jogo.
Você costuma jogar outros tipos de Poker, além do Hold’Em?
Com os velhos amigos do Santa Cruz ainda jogo o poker fechado e o velho stick. Sou também o “reserva” de uma roda de amigos que jogam juntos todos os sábados há cerca de 40 anos. Lá também rolam mais estes estilos e mais uma ou outra variedade nos famosos festejos. Com eles, inclusive, fiz um royal há alguns meses, o que não me acontecia há muitos anos.
Normalmente, como é o seu estilo de jogo?
Meu estilo veio variando e sendo construído ao longo dos últimos meses. Para um torneio como o WSOP, vim jogando mais sólido, jogando poucas mãos e tentando uns lances a cada par de rodadas – roubar uns pingos em boa posição é fundamental. Nos torneios mais rápidos, em que os blinds sobem muito rápido, é preciso ser mais agressivo.
Onde você costuma jogar?
Jogo muito em São Paulo, principalmente nos torneios organizados pela Federação Paulista de Poker, que foi criada este ano. Joguei também alguns torneios em Punta e Assunción, mais como treino para o WSOP. Estou começando a me acostumar mais com os jogos pela internet, principalmente no Party Poker e PokerStars, e meu nick por lá é MaxBrod.
O que você diria a quem está começando agora no Poker?
Acho que diria apenas que não há segredo. Como em qualquer esporte ou qualquer arte, é 90% transpiração e 10% inspiração. Precisa de muita disciplina, muito estudo e cabeça no lugar. Selecionem bem os torneios que pretendem jogar, preparem-se bastante para eles e cheguem com sua estratégia bem montada. Fora isto, nada substitui “horas de vôo”. É na mesa que você vai passar por diversos tipos de situações e aprender a agir na hora em que estiver jogando aquele torneio importante.
Quais são os planos para o seu futuro no Poker?
Foram muitos meses de preparação e investimento para jogar bem este WSOP e acho que a primeira experiência foi muito legal. Pretendo jogar alguns grandes torneios por ano e ver como me saio antes de tomar qualquer decisão.
Antes do WSOP 2006 gostaria de tentar jogar alguns torneios do WPT, quem sabe o de Aruba em outubro. Além disto, pretendo jogar um pouco mais pela internet.
O espaço é seu, você é quem manda.
Antes de terminar, queria agradecer a todo o pessoal que me deu a maior força quando eu estava lá. Além do Omar e do Zidane, foi muito legal ver as diversas comunidades de poker no Orkut acompanhando e torcendo. Recebi mensagens e apoio de muita gente de diversos lugares do Brasil e muitas delas que nem conheço (ainda!). Obrigado ao Clube do Poker (Raul, venha a São Paulo jogar com a gente) pela divulgação e pelo incentivo. E um beijão especial para minha família (mãe, pai, Nelson, Carla e meus irmãos Marcel e Igor) e para a querida Tati, que ficaram torcendo aqui do Brasil!
Nós que agradecemos… : )