Joio e Trigo

Por Bruno Nóbrega de Sousa01/04/2008

Para julgar com sabedoria é preciso conhecer. Observe o seguinte trecho: “O UTG+1 deu raise padrão de três vezes o big blind. A mesa rodou em fold e apenas o cut-off pagou. Considerando as implied odds, o jogador under the gun entendeu que o slowplay não seria o move ideal, então optou pelo all-in para evitar o showdown”. Será que alguém que não vivencia o poker saberia do que se está falando? Dificilmente. E sabe por quê? Por se tratar de um universo à parte, ainda desconhecido da maioria das pessoas.

E como julgar corretamente o que não se conhece? A História nos lembra casos trágicos como o de Sócrates, acusado de subverter a juventude grega, e Galileu Galilei, condenado pela “Santa Inquisição” por ter dito que a Terra girava em torno do Sol. Pois bem, aqueles que atacam o poker sem conhecer suas estruturas parecem repetir a postura dos julgadores que hoje a História condena.

Epistemologicamente falando, o poker pode ser considerado uma “tecnologia” (no plano do conhecimento formal, ele se encontraria no mesmo patamar do saber jurídico, por exemplo) que parece começar a assumir contornos de “ciência” – vide as inúmeras publicações acerca da teoria, da psicologia e da matemática do poker, e olhai também o posicionamento pedagógico de algumas nações desenvolvidas, como a Finlândia ou a Dinamarca, que utilizam o poker para ensinar às suas crianças uma vasta quantidade de noções utilíssimas fora do feltro, como o respeito às diferenças, a aplicação da teoria das probabilidades e a despersonalização dos conflitos. Os puristas diriam se tratar de uma blasfêmia, os visionários chamariam de “futuro”.

Apesar de ser um entretenimento fascinante, o poker disputado profissionalmente é algo sério, mas, infelizmente, os leigos ainda pensam tratar-se de um “jogo de sorte”. Ledo engano. Comparar o poker à roleta ou à loteria é a postura padrão do senso-comum, geralmente carregada de preconceito e falta de conhecimento.

É preciso separar o joio do trigo, que há de se tornar o pão de muitos, com toda a honra contida no suor do nosso rosto.

Bruno Nóbrega de Sousa é Editor da Revista Card Player Brasil